Conheça todos os 'escudeiros' e a 'escudeira' do presidente atleticano,
que ajudaram o clube alvinegro a triplicar o orçamento nos últimos anos
Alguns são mais conhecidos, como o vice-presidente Daniel Nepomuceno, a diretora-executiva Adriana Branco e o diretor de futebol Eduardo Maluf. Além deles, trabalham para o Atlético-MG outros seis abnegados, cujo único objetivo é recolocar o clube na prateleira de cima do futebol nacional, na disputa de títulos e competições de expressão.
O GLOBOESPORTE.COM reuniu os homens-fortes da retaguarda atleticana para uma conversa reveladora, para que pudessem explicar como ocorreu o ‘pulo do gato’ que recolocou o Atlético-MG na vitrine, depois de anos como motivo de críticas, de menosprezo. Tudo começou no fim de 2008. Eleito presidente, Alexandre Kalil montou um grupo com pessoas que já circularam pelos bastidores do clube em outras gestões, casos de Adriana Branco, do assessor Sérgio Sette Câmara, que já foi vice-presidente, e do também assessor Luis César Vilamarim, engenheiro e primo de Kalil, que participou da reformulação da Cidade do Galo, que, na década de 1990, tinha apenas um campo e um acanhado vestiário e, em 2010, foi eleito o melhor do país.
(Foto: Marco Antônio Astoni / Globoesporte.com)
E Gropen convidou outros atleticanos para trabalhar com ele. Todos “remunerados pela paixão”, como ele mesmo definiu: os também advogados Lásaro Cândido, hoje diretor jurídico, e João Avelar, atual assessor jurídico. Pouco tempo depois, o grupo ganhou mais um integrante: Carlos Fabel, administrador de empresas e contabilista, com 33 anos de experiência no mercado financeiro, que trabalhou em seis bancos antes de aceitar o convite de ajudar o clube para o qual torce. Ele, Adriana Branco e Eduardo Maluf são os únicos integrantes remunerados deste “staff vip”, que participa das decisões mais importantes do clube nestes últimos quatro anos, inclusive contratações. E que se comprometeram em nunca revelar os assuntos discutidos na sala da presidência.
- Um dos segredos da administração do Kalil é que nunca vazou nada, destaca Rodolfo Gropen, que acompanhou o presidente na viagem a Porto Alegre, onde fecharam o negócio com Ronaldinho Gaúcho. Nem para os filhos atleticanos ele contou.
- As pessoas na academia me perguntam, já rindo: “E, aí, Sérgio? Quem vem?” Elas sabem que eu não falo nada. O segredo não é a alma do negócio? Pois é assim que aqui acontece agora, define Sérgio Sette Câmara, que tem história no Atlético-MG. Entre idas e vindas, participa da vida do clube desde 1999. Pode falar, “de carteirinha”, de erros cometidos no passado, em outras gestões. Sem citar nomes, lembra de histórias que fizeram o nome do clube ficar “queimado” no mercado.
(Foto: Reprodução / TV Globo Minas)
As histórias contadas por estas pessoas podem virar um manual de autoajuda para clubes endividados e com o “filme queimado” no mercado, como foi o Atlético-MG por muitos anos. Um clube que chegou a ficar cerca de dois meses sem presidente, na época da renúncia de Ziza Valadares. Que já atrasou salários por três meses seguidos e fazia contratos únicos para jogadores, o que significava que a multa rescisória dos atacantes Marques e Guilherme era a mesma que de atletas de menor expressão. Que triplicou o orçamento nos últimos anos, de R$ 60 milhões, em 2008, para R$ 180 milhões, que é o montante previsto para 2013.
De uma coisa, no entanto, todos fazem questão. Mesmo cientes que herdaram um clube com muitos problemas, o “staff vip” atleticano não aponta culpados, não destaca erros em administrações anteriores. Por ordem expressa do presidente, o trabalho é olhar para frente.
- O grande desafio foi esse: criar um muro, deixar para trás o que passou e estabelecer um novo conceito empresarial, explica o diretor financeiro Carlos Fabel.
- E não teve milagre. O Atlético-MG estava chegando ao fim. O Alexandre deu um murro na mesa, de basta, se cercou de gente que resolveu se doar para ajudar o Atlético-MG. Não existia isso no retrospecto do clube. Saímos do caos e hoje temos controle, destaca o diretor jurídico Lásaro Cândido.
- O Atlético-MG tem sido mal administrado há 20 anos, com alguns intervalos de suspiro. Se você plantar esse trabalho para os próximos 20 anos, o problema estará resolvido. Você tem que ter um grupo que pensa igual. É assim hoje. Por isso está funcionando, avalia o assessor jurídico João Avellar.
O começo de tudo
O ano era 2009. O primeiro da gestão Alexandre Kalil. Na época, estava em pauta a renovação do contrato master de patrocínio da camisa. O clube recebeu R$ 3 milhões em 2008, e o presidente pediu R$ 9 milhões para o ano seguinte. A empresa, fabricante de automóveis, que estampava o nome, não aceitou aumentar. Kalil não aceitou receber menos, queria valorizar o nome do clube. E o Galo jogou a temporada inteira sem patrocinador. Deu certo. Em 2010, com a chegada de novos parceiros, foi para os R$ 9 milhões que o presidente queria.
- Foram dois anos que sofremos demais, lembra Gropen.
- As receitas caíram, o pay-per-view também. Ficamos sem estádio em Belo Horizonte e tivemos de fazer jogos na Arena do Jacaré a R$ 5, R$ 3, R$ 2. Hoje, você põe ingresso a R$ 300 e vende, destaca Sérgio Sette Câmara.
- Mostramos a todos essa nova postura. Queira ou não, o Atlético-MG já teve três meses de salários vencidos, poderia perder passe de jogadores. Houve um choque de gestão: enxuga tudo, zera tudo, vamos correr contra o tempo. O dinheiro que tinha era para colocar a folha em dia, lembra Luis César Vilamarim.
- No ano que ficamos sem patrocínio, vieram várias empresas, mas para pagar valores baixos ou por determinados jogos. O Kalil não aceitou, conta Fabel.
- Porque se você aceita isso, posteriormente, não consegue fazer um bom contrato. Se você está com anúncio de uma bala na camisa pagando R$ 5 mil, no ano seguinte não consegue convencer uma empresa a pagar R$ 50 mil, complementa Vilamarim.
- Essa história de valorizar a marca foi muito importante. Em 2008, a receita do Atlético-MG era de R$ 57 milhões. Neste ano, vamos fechar com aproximadamente R$ 75 milhões, contabiliza Fabel.
BMG
Assim como quase 30 times do futebol brasileiro, o Atlético-MG carrega a marca do BMG estampada no uniforme. A ligação com o banco é antiga, já que Ricardo Guimarães, presidente da instituição, já foi o principal mandatário alvinegro. Torcedor atleticano, colocou dinheiro do próprio bolso no clube. Os valores não são revelados.
- A primeira grande demanda que o Alexandre me passou foi organizar essa dívida com o Ricardo Guimarães. É uma dívida com ele, e não com o banco. O BMG faz no Atlético-MG o que faz em todos os clubes que patrocina: tem alguns investimentos. O conselho fez uma auditoria e apurou o valor que o clube deve ao Ricardo, que emprestava como pessoa jurídica. Hoje, temos um contrato em que o Galo paga uma mensalidade ao Ricardo para quitar essa dívida, informa Gropen.
Dívidas
Os números são assustadores. O clube já teve a taça de campeão brasileiro de 1971 e a sede administrativa penhoradas como garantia de pagamento de dívidas. Pagou mais de R$ 80 milhões, mas ainda falta muito. Muito mesmo. O diretor financeiro do clube, Carlos Fabel, confirma que a dívida ultrapassa os R$ 310 milhões.
Dívidas que têm sido equacionadas em parcelas mensais: R$ 800 mil vão para Timemania, Refis e Ricardo Guimarães. São feitos depósitos mensais no Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de R$ 700 mil para o passivo trabalhista. E a dívida bancária, de acordo com Fabel, ‘é equacionada com recebíveis futuros’.
- Temos um débito bancário de, aproximadamente, R$ 60 milhões, todo calçado com recebível. Não existe dívida não-liquidável, não existe bola de neve. Toda dívida que é administrável, desde que se recupere o crédito. E foi o que fizemos.
- Eram fornecedores de gêneros alimentícios, ações cíveis que o clube fez acordo e não pagou. Usamos as receitas de televisão para pagar, destaca Fabel.
Mais de R$ 80 milhões de dívidas do passado já foram pagos. O grupo de retaguarda garante que está tudo organizado, sendo renegociado. Impossível determinar um prazo para que não haja mais credores. Calcula-se que, até o fim de 2013, o clube encerre o passivo trabalhista.
- Quando cheguei, tinha R$ 27 milhões, além de outras ações que estavam rodando no TRT e que não estavam definidas. Esse montante virou R$ 45 milhões, de ações que estavam para ser julgadas de gestões anteriores. E destes R$ 45 milhões, já pagamos R$ 40 milhões.
Por mais incrível que possa parecer, apesar do valor astronômico que ultrapassa os R$ 310 milhões, a situação do Atlético-MG é definida como tranquila pelos homens-fortes de Alexandre Kalil.
- Nenhum clube tem um shopping que vale R$ 1 bilhão e que, daqui a 14 anos, será do Atlético-MG. O importante é saber que o Atlético-MG dá lucro. A diferença entre a receita e a despesa é positiva. Está projetado um lucro de R$ 50 milhões para o ano que vem, contabiliza Fabel.
Pulo do gato
A mudança interna é chamada pelos homens-fortes do Atlético-MG de “choque de gestão”. E ocorreu de 2008 para 2009. O trabalho no início da gestão Kalil foi pesado. O orçamento do clube era praticamente a metade do Cruzeiro, o principal rival. Carlos Fabel, contratado para administrar a parte financeira do Atlético-MG, se assustou quando assumiu a função.
- Quando cheguei, achei que ficaria três dias. Fiquei três meses...três anos! Me assustei, porque vim do mercado financeiro, onde as coisas são bem estruturadas. E o Atlético-MG tinha dívida, falta de crédito. Quando cheguei, eram 180 protestos no Serasa, 254 ações executivas no Fórum. Encontramos conta de Correio e Copasa atrasada, acordo com o Ministério do Trabalho rompido. O Atlético-MG não tinha crédito para comprar gênero alimentício. A primeira coisa que fizemos foi parar de atrasar, lembra Fabel.
- Tínhamos um problema sério: o clube fazia acordo na Justiça do Trabalho e não pagava, conta Sérgio Sette Câmara.
Cerca de 200 funcionários foram mandados embora.
- Existia muito cargo. Não adianta você mandar embora um cara que ganha um salário mínimo. Você enxuga área que tinha diretorias, cargos. Gente que era diretor internacional, e o cara ficava viajando pelo mundo sem gerar resultado, lembra Luis César Vilamarim.
- A máquina trabalhava com déficit muito grande. O Kalil fez esse enxugamento para diminuir esse déficit mensal que tinha, explica Fabel.
Os clubes campestres, Labareda e Vila Olímpica, eram deficitários e estavam sucateados. Fabel lembra que chegaram a dar R$ 100 mil de prejuízo. Foram modernizados e hoje contam com seis mil sócios. Passaram a dar receita e geram R$ 7 milhões por ano. Superávit que é investido nos dois clubes.
Barcelona
(Foto: Agência Reuters)
- Não adianta estar tudo organizado aqui dentro, pagar todo mundo em dia, sem títulos. Nos últimos anos, o Atlético-MG tem recuperado muita torcida. Isso não tem preço. Mas precisa de um título. Até como um prêmio para a gente que trabalhou, que se dedicou tanto. Só nós sabemos como nos dedicamos.
- Têm aqueles que reclamam do vento, aqueles que esperam o vento passar e os que ajustam as velas de acordo com a mudança do vento, para aproveitá-lo. O grupo que o Alexandre formou não reclama e nem espera o vento mudar de curso. É um grupo que ajusta as velas a cada vento para caminhar, define João Avelar.
- Consigo imaginar o Atlético-MG igual ao Barcelona. Não consigo pensar diferente. Enquanto isso não acontecer, não vou estar satisfeito. E isso é trabalho para mais de dez anos, complementa Avelar.
Serviço nos bastidores sendo feito, agora é a vez dos jogadores em campo.